quarta-feira, 10 de abril de 2013

Mudanças (apenas)

ela vê o enfeite na entrada da sala de estar
que entra todos dias, nos mesmos horários

reconhece o sorriso da boneca decorada
puxando um vestido curto com cara de levada

na lateral, sem que a boneca ao menos possa ver
a fresta da janela quase aberta, quase fechada
faz surgir um efeito de possibilidades
faz o sim pesar tanto quanto o não
traz curiosidade, desejo, receio
traz a mesma visão conforme o vão

o que acontece com a janela que nada fala
ela abrirá ou fechará

a janela fica imóvel a espera de um contato
quer a brisa ou tempestade ou o sentir  de mãos

a boneca que parece enfeite de decoração
está imóvel, em uma posição, levemente anexada a parede
ela não apenas sorri, não apenas serve de porta chaves
a boneca tem uma razão

a boneca revela um momento, uma passagem de tempo
um prósito de consumo, uma alegria, uma imaginação

porque escolher uma boneca para carregar segredos de chaves
porque essa boneca tem que sorrir imóvel
sem ambição ou função para outra utilidade

a casa externa uma (des) combinação de momentos
premeditações, acasos, descasos, poeira, identificação
sonhos

o que tem em uma casa, não tem em outra casa não
assim habita no corpo uma porção de coisas combinadas
e não habita em nenhum outro corpo igual combinação

a brisa que fechará uma ou as duas abas da janela
é parecida com o vento que fará bater as abas com tal
força que estourará nas paredes laterais com um estrongo

o mesmo ser de hoje, nada se parece com aquele outro ser
tudo que tem vida em contato não apenas muda

mundanças não descendem de apenas
mudanças são poesias que surgem
da dança de acasos com tomadas de decisão